Sentada na estação da pequena cidade de Jaú, São Paulo esperava pacientemente pela chegada de seu pai. Era a sua alegria. Aquele momento tão esperado depois de tantos anos sem a sua presença.
Quando ouviu o apito do trem levantou-se e ajeitou a saia que estava amassada. Seu sorriso de longe notava-se. Não cabia dentro de si de felicidade. Lembrou-se dos pequenos momentos em criança com seu pai. Das idas em cavalinho nas suas costas, das farras no tapete da sala quando ele lhe fazia cócegas. E, sobretudo, a sua gargalhada alta e gostosa.
Nina sente-se ofegante. Afinal seu pai voltara para ficar de vez em casa. Quantos anos longe dele? Contava os minutos para poder abraçá-lo e saber tudo que aconteceu no exército. Certamente teria cabelos brancos, estava aposentado, e sua vida agora seria sua família.
Finalmente o trem parou. Ficou olhando os passageiros descerem um a um. A ansiedade era muita, por isso, segurando na mão de sua mãe começou a andar mais rápido. A mãe percebendo a atitude da filha solta-lhe a mão e Nina sai correndo em direção aos passageiros. Fica ali procurando seu pai avidamente com seu olhar.
De repente percebe um sorriso, era ele. Correndo em sua direção nem percebe direito que as pessoas andam em sentido contrário do seu. Um passageiro quase a atropela, parecendo que vai cair, mas segurando num poste consegue se equilibrar. Ao chegar perto de seu pai, lágrimas escorrem de seu rosto. Os dois nem dizem nada, pai e filha se olhando. Aos poucos ele abaixa-se e a pega em seu colo. Nina toda feliz deixa-se abraçar por ele. Que saudades de seu pai. Ele parecia maior do que a última vez que o vira.
Continuava com seus cabelos negros, seu sorriso largo e feliz, muito feliz. Nina pergunta suavemente se veio para ficar. Ele a coloca no chão e com um sorriso não diz nada, apenas continua sorrindo. Os dois vão andando de mãos dadas pela estação. Sentada no banco e olhando tudo com ar de felicidade estava sua mãe. Os dois juntos novamente. Ele aproxima-se e a abraça longamente. Dá-lhe um demorado beijo deixando a mãe enrubescida. Estão ali, finalmente juntos.
Os três sentam-se no banco e a visão do trem parado ali parece que finalmente chegou ao seu destino.
A estação fica em silêncio, agora só resta os três ali sentados admirando a paisagem e aquele momento da família reunida.
Sem dizer nada seu pai abre uma mala e de lá de dentro retira uma pequena caixa de madeira. Nina fica admirada e imaginando o que haverá ali dentro. Será um presente? Sem dizer nada seu pai lhe dá a caixa. Ela olha interrogativamente para o rosto de seu pai a perguntar o que seria. Ele apenas sorri e estende a mão como a dizer: abra a caixa filha!
Devagar ela abre a caixa com uma chave que seu pai dá. Parada e olhando fixamente ela percebe que há muitas cartas, fotografias, bilhetes.
A menina curiosa pega numa carta com um desenho e percebe que é seu traço. Seu pai guardou todas as cartinhas que ela enviara a ele durante os longos seis anos em que ficara fora. Nina contava agora com onze anos. Lembrava-se vagamente de algumas coisas, mas as cartas, nunca esquecera.
Ela sorri entre lágrimas e seu pai as enxuga com seu lenço branco. Revira toda a caixinha e vê muitas fotos de seu pai, amigos, festas na caserna. Vai perguntando o que cada uma significa e ele vai lhe contando. Tem muitas histórias para contar diz ela ao pai. Sim filha, tenho muitas histórias, mas a mais bonita é sobre ter você como minha filha.
Quero que saiba que voltei e que nunca mais vou deixar vocês duas. A sua mãe olha interrogativamente para seu pai. Ele apenas sorri, segura as suas mãos e diz que vai ficar tudo bem. Está reformado do exército, terá uma boa aposentadoria. Apesar de ainda ser novo resolveu assim, pois não queria ficar mais longe de seu bem maior que era a esposa e sua filha Nina. E disse-lhe que trabalharia em alguma coisa para completar o que faltasse para sua família.
Nina toda feliz quer saber de todas as histórias das fotos. Curiosa continua a perguntar a seu pai o que cada uma conta. Com paciência e carinho ele vai contando. Ela vê uma foto de seu pai sentado num tronco de árvore derrubada e ainda com seus galhos verdes ao chão. Ele diz que essa árvore era muito antiga, tinha mais de cem anos e que recebeu uma descarga elétrica no mês anterior com a tempestade que caiu furiosa. Abaixou os olhos e de repente ficou triste. Nina pergunta porque de sua tristeza. Ele responde que foi devido a isso que decidiu encerrar a sua carreira. Pois era debaixo dessa árvore que costumava ler as suas cartinhas. Percebeu que não queria mais ficar longe delas. Nina sorri e dá um grande abraço em seu pai. Os dois ficam ali abraçados e nem percebem que o maquinista do trem se aproxima. Chamando seu pai pelo nome, ele vira-se e percebe a mulher lhe dizer que estava na hora de irem embora.
Lágrimas escorrem do rosto de Nina que nada entende. Seu pai sorrindo lhe diz que em breve ficarão juntos para sempre. Que um dia nada mais os separará. Ela pergunta onde ele vai. Ele responde que irá para um lugar que ela não poderá ir agora, mas que ela ficará com as suas lembranças e as muitas histórias que contém cada fotografia daquela pequena caixa de madeira.
Nina lhe sorri e diz que ainda não contara todas as histórias, que precisava saber mais delas.
Ele pergunta porquê. Nina sorri e diz que quando crescer irá escrever as memórias de seu pai. Contará toda a sua vida em um livro. Seu pai solta uma grande gargalhada, daquelas que Nina adorava. A abraça fortemente e dá um grande beijo no rosto. A maquinista do trem diz que precisam ir, estão no horário e tem mais passageiros no caminho para pegar. Seu pai diz que já irá. Mais uma vez se dirigi a esposa e dá um grande beijo e diz até já, minha querida.
Nina sem perceber direito o que se passa olha intrigada para o pai. Ele apenas sorri e segue em direção ao trem. Desesperada a menina começa a correr atras dele. Sua mãe lhe chama, mas ela não quer saber, quer ter o pai ao seu lado. Sorrindo na janela seu pai acena. Lentamente o trem vai partindo deixando a menina ali, parada sem entender o sentido daquilo tudo. Pensando em sua cabecinha que logo ele estará de volta. Ela sorri e ele acena com a mão dando adeus.
Uma voz vinda de longe chama por ela, Nina, acorda meu bem, está na hora de almoçar.
Foi um sonho, um lindo sonho que tivera com seus pais. Os dois vieram ter com ela e dizer que tudo ficará bem.
As vezes a vida nos prega peças. Essa com certeza ficará em minha memória. A visita de meus pais e o abraço deles que ficará para sempre em minha memória. E pai, saiba que ainda escreverei um livro sobre a sua vida. Um grande beijinho para ti e a mãezinha. Pois um dia estaremos juntos novamente!
Silvia Gallanni 13/09/2020